"Tentativa da CBF de reduzir idade de profissionalização no futebol é inconstitucional", afirma procuradora do trabalho
A CBF anunciou, em agosto, o interesse em alterar algumas partes da Lei Pelé para propor a redução da idade mínima para 12 anos para que jovens iniciem sua formação profissional em centros de treinamento em tempo integral - contra os 14 anos permitidos atualmente. Para a CBF, o Brasil seria o único país a proibir a comercialização de atletas antes da idade mínima laboral.
No entanto, a procuradora do trabalho Cristiane Sbalqueiro Lopes, do Ministério Público do Trabalho do Paraná, acredita que a CBF está confundindo o fiasco do Brasil na Copa do Mundo da Fifa e a suposta falta de formação profissional precoce. Segundo ela, a proposta é inconstitucional, uma vez que a Constituição Federal proíbe trabalho para menores de 14 anos, salvo na condição de aprendiz, e trabalho noturno, perigoso ou insalubre aos menores de 18 anos.
"A Constituição Federal não proíbe, ao contrário, assegura o direito à educação e à prática desportiva, em qualquer idade. Competir também pode, em qualquer idade, desde que em ambiente educacional e de participação. Mas está veementemente proibido o exercício de qualquer trabalho a menores de 14 anos, sem qualquer exceção", afirma a procuradora, que também é Presidente da Comissão do Atleta da Coordenadoria Nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente (Coordinfância).
A Lei Pelé, que trata das normas gerais do esporte, fala sobre os requisitos mínimos para que as pessoas com mais de 14 anos possam iniciar um processo de profissionalização por meio de um contrato de formação desportiva. Apenas nessa condição a Lei Pelé possibilita que adolescentes vivam alojados nos clubes, com a contrapartida dos clubes providenciarem acompanhamento escolar, apoio pedagógico e psicológico, convivência comunitária e familiar.
"O problema das categorias de base não é a idade mínima de recrutamento, mas a falta de uma política que incentive a formação desportiva com viés simplesmente educacional, ou seja, sem pretensão de comercialização futura dos atletas com menos de 14 anos", sustenta a procuradora. Ela sugere que a CBF dirija sua autoridade para lutar pela construção de um sistema nacional de formação desportiva e um fundo para incentivo à formação. Antes de 14 anos, deveria ser respeitada a liberdade de prática, e durante o período profissionalizante deveria ser priorizada a formação local, nas cidades de residência atletas, preservando a unidade familiar e sua infância, bem como propiciar a matrícula escolar e o acompanhamento frequente do aproveitamento do aluno.
"O sistema que vemos atualmente beneficia poucos, está afundando o futebol brasileiro e provocando o desperdício da vida de crianças sumidas em centros de formação de qualidade duvidosa. Proliferam gestores ambiciosos e despreparados, que correm atrás da sorte sem cuidar de verdade da educação dos jovens", critica.
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